Bangu
Uma vez mais o povo brasileiro assiste estarrecido a mais um episódio funesto de como vão as coisas neste país em termos de segurança. Claro que elas não se limitam unicamente ao problema da segurança, mas, aqui, é o que interessa.
O que preocupa não é tanto o retrato cada vez mais hediondo que se pinta das convulsões das sociedades livre e carcerária. O que dói é a observància de como o problema é tratado pelas autoridades, a conduta gentil e irresponsável com que essas autoridades lidam com o fato. Na verdade, a indecência maior é perceber que os dirigentes deste país assistem a tudo como se estivessem assentados na poltrona de um cinema, diante de uma tela que retrata uma violência gerada pela criatividade dos diretores de Hollywood.
Mas não é esse o fato. As coisas que acontecem no Brasil, salvo declarações governamentais acerca do bem-estar do povo, não são de mentira, nem produtos da imaginação de nenhum diretor de cinema. São fatos reais, ainda que cinematográficos e são coisas sérias demais apesar da frouxidão com que são tratadas pelas autoridades.
Vide os últimos acontecimentos: Bangu III e o sequestro, agora, de pobres. Não que o sequestro de ricos deva ser permitido, mas pelo fato da banalização da "atividade" que já se estende as camadas menos favorecidas, o que significa que o que se pretende com os delitos sequer é grande soma em dinheiro mas apenas recursos para a subsistência dos vícios daqueles que os praticam. E quem perde, uma vez mais, é a sociedade obreira, cada vez mais enclausurada nas suas próprias casas cheias de grades, diga-se de passagem, inúteis, nas portas e janelas.
Mas Bangu III, ao que parece, não tem mais grades senão amontoadas no pátio da prisão, arrancadas pelos ilustres moradores do intramuros que não suportam os muros, as paredes, as grades, os funcionários. Não suportam e rompem com os muros, com as grades, com os funcionários, com o sistema. E fica tudo como está. Esse é um lado da coisa.
Mas existe um outro tão grave quanto esse, talvez ainda pior. Quem vê o arsenal que se encontra dentro das prisões fica estarrecido. Certamente, dentro das celas as armas encontradas são de maior poder de fogo e mais possantes, em todos os sentidos, que as que fazem parte do património. E como é que elas chegam lá? Não é por materialização do pensamento, nem por nenhum dogma divino do tipo "faça-se a luz". Aqueles artefatos entram pela porta, são levados por pessoas e passam por pessoas outras que têm a obrigação legal de impedir as incursões.
De duas, uma: alguém ganha com isso, ou ninguém pode fazer verificação nenhuma sob pena de represálias oficiais e oficiosas, a segunda dos marginais e a primeira das autoridades. Será uma destas ou seriam as duas?
Campo Grande-MS, 23.11.2001 - 10:03
Indalus
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