Olho pra fora e é noite.
Pela janela, estrelas e vagalumes.
De vez em quando, o barulho dos grilos
interrompe o canto do rio,
consigo, meus pensamentos, seus filhos.
Sinto-me parte de suas águas,
filha do céu, da noite.
O rio lava minhas mágoas,
seca feridas e cura dores.
Seu barulho me embala,
me alivia, alegra, consola,
passa e leva as pedras.
E meus pensamentos rolam.
Como as pedras,
que vão para destinos distantes,
desconhecidos por mim.
Como estas pedras errantes,
meus pensamentos vagam
junto com o seu curso.
Não sei bem por onde passam,
nem percebo seu percurso.
Não páro para observar
onde este rio vai dar.
Deixo que os pensamentos
sigam sós seu caminhar.
Tropeçam às vezes nas pedras
que moram no leito do rio,
por vezes se engancham nos galhos,
outras vezes sinto seu frio.
Um frio que não me atrapalha,
que não me gela por dentro.
Às vezes é só um arrepio
que vem junto com o vento
e segue junto com o rio.
Permaneço assim, parada,
a observar suas águas
a aliviar-me o peito,
levando consigo as mágoas.
O rio, feito água benta,
me leva, me abençoa.
Sigo-o junto com o vento.
Não preciso de canoa.
Sinto-me filha da noite
e também filha do rio.
Sou parte deste cenário
que a natureza constrói.
Nada, neste momento,
me acorrenta, nem me dói.
Ouço a mensagem do rio,
que, a correr sem se deter,
transpõe todos obstáculos,
sem nunca cessar de correr.
Ouço a mensagem da noite,
que a tudo cobre agora,
como a dizer que ao longe,
logo virá a aurora.
Ouço o que diz a noite
e tudo que o rio me diz
e vejo que a vida é o mesmo:
sempre dá pra ser feliz.
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