Réquiem para um sonho
De repente, descobri-me grávida.
Grávida de amor - ávida !
Não tinha sido planejado.
Não era sequer desejado.
Mas tinha acontecido.
Silenciei, pensando com ia lidar com aquilo.
Depois contei ao criador,
O homem que fecundou aquele amor.
Sem saber a reação, pedi sigilo.
Ele estranhou, ignorou...silenciou.
Não era com ele... Era coisa minha.
Como a raposa do pequeno príncipe,
Eu me deixara cativar... sozinha...
Agora corresse o risco de chorar.
Não cabia cobrança mesquinha.
Silenciei novamente.
Sentia o amor dormente,
Crescer em minhas entranhas.
Eram emoções um tanto estranhas.
Como poderia acontecer aquele acidente?
As vezes ficava tomada por alegria,
Tristeza, raiva e melancolia
Ira... uma raiva voltada pra mim
Por ter me envolvido assim.
Deixado as coisas chegarem aquele fim.
Considerei aquele nascituro
Um amor espúrio.
Fruto de geração espontânea, impuro.
Quase um filho de proveta... repúdio.
Um amor prematuro, embora maduro.
Pensei... Imaginei uma solução,
Consultando apenas a razão,
Decidi negar o amor, abortar.
Mais uma promessa de amar
Nati-morta. Uma agressão.
Escolhi o método químico
Tomei uma porção de mesinhas,
Cachaça, gim, absinto e vinho
Ao fim, consegui uma ressaca...
E, de quebra, uma boa enxaqueca.
O amor continuou aqui dentro.
firme, forte, meio sufocado...
Mas crescendo... ignorando ser o centro
De uma comédia meio sem graça, quase parada.
Um descuido, trapaça, um quase pecado.
Mudei de método, parti para o cirúrgico.
Agora era um silêncio absoluto
O prematuro amor agonizava.
Fez-se o som de um triste luto.
Um verso escrito, sem palavra - telúrico.
ventilação, ambu, adrenalina,
Laringoscópio, tubo, dopamina.
Era torturante... Febre alta, septicemia...
Sangravam-me todos os poros - uma hemorragia...
Baixei na Unidade de Tratamento da Ilusão. Foi uma correria...
Mais uma tentativa frustrada...
O amor continuou em mim crescendo...
Ele nasceu prematuro... desestruturado
Um amor triste e fraco, mal alimentado.
Não tenho como nutri-lo. Estou desertificada.
Cometerei infanticio, está decidido.
Cada dia, tomo-o no colo, com minhas mãos,
Aperto-o devagarzinho, deixando-o sem respiração.
Sentindo-o estremecer entre meus dedos, sem reação.
E a cada estertor deste amor indesejado, meu coração
se aflige, agita e grita,
Desejando que ele viva.
Tereza da Praia
Série: "Poesias nos pratos de Rosa e Prosa na balança de Lia."
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