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Poesias-->NOTÍCIAS DE UM BRASIL QUE NÃO É NOTÍCIA -- 18/05/2004 - 15:54 (Rogério Beier) |
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O BRASIL QUE NÃO É NOTÍCIA
por Rogério Beier
I
Acorda já cansado
Imaginando o árduo trabalho
De mais um dia à cata de trabalho
Que lhe renda ao menos um mísero trocado.
Seu nome é José
O de sua mulher,
Maria
Não têm nem pro café
E é assim que sai a buscar trabalho
Nem bem raiou o dia:
De barriga vazia.
Todo dia é a mesma frustração
“Tens muita experiência,
Mas com essa aparência?
Ah não! Aqui não tem vaga não”
Sua única camisa está furada,
Sem botão.
Sua calça, já está esgarçada,
E sem nem um tostão.
José se pergunta: “Como manter a bendita aparência então
Se não há nem para feijão? ”
Volta pra casa naquela tristeza
E ao entrar,
A mistura dos olhares é de impressionar:
O de Maria, traz a esperança de ao menos um jantar.
O de José, apenas a dura certeza
De mais um dia sem jantar sobre a mesa.
Aquela situação haveria de acabar
José pensou em sua filha, ainda por criar
E na mulher novamente grávida
Só pra piorar.
II
No outro dia, bem cedo se levantou
Não havia dormido.
Durante toda aquela noite
Um plano arquitetou,
Iria falar com o presidente
Ele tinha sido pobre.
Era gente como a gente,
Haveria de entender a situação
Nem bem o sol raiou
Saiu para tomar as providências
Daquela sua reunião com a presidência.
E tudo saiu como planejou.
Vendeu seu único bem
Aquele “barraco” onde apenas sobrevivia
Com sua filha Graziela e Maria
E agora
Sem muita demora
Era só partir para Brasília.
Logo, o ônibus chegou e partiu
José, com sua esperanças renovadas,
Apenas olhou pra trás e sorriu
Aqui vou eu, nessa minha jornada
Para falar com o presidente do Brasil”.
III
Em Brasília, 19 horas
Marcava o relógio da rodoviária
José se aprumou, e partiu sem demora
Não queria deixar Maria muitas noites solitária
Saiu em sua primeira caminhada pelas ruas da capital
A pedir informações
De como chegar no palácio presidencial
Sem dúvida que demorou
Mas ao amanhecer do outro dia, chegou
Tão logo chegou
Partiu para sua missão completar
Em sua inocência
Pensou que era só chegar e entrar
Não entrou
A segurança presidencial logo o barrou
“Quero falar com o presidente”
disse o pobre José renitente
Sua resposta foi o velho e conhecido “NÃO”
Pediu, implorou, ajoelhou e explicou
Mas aos seguranças ele não impactou.
Disseram que iam levar sua mensagem ao presidente
Mas isso não lhe bastou,
Ele jamais saberia se a mensagem chegou
Fazer algo era urgente
Não podia mais demorar
Maria e Graziela estavam a lhe esperar
Saiu dali para algumas coisas comprar
Pensava consigo “O presidente há de me ouvir,
Custe o que custar“.
No primeiro dia, preparou um grande cartaz
Contando sua tragédia e pedindo audiência
Pensou que assim, comoveria a presidência
Mas não conseguiu atrair sequer um olhar fugaz
No segundo dia, novamente tentou o cartaz
Fazia muito barulho e buscava atrair atenção
Muitos paravam e olhavam para mais uma atração
E ao final saiam caçoando do pobre rapaz
José tentou novamente entrar no palácio do ex-metalúrgico
Mas os seguranças o impediam com movimentos cirúrgicos
E antes de desistir, ouviu um deles dizer
“Sua mensagem chegou ao nosso presidente,
mas ele simplesmente não quer lhe atender.
Como você, há milhões no Brasil,
Imagine se todos vierem nessa porta bater?”
IV
José ficou desolado
Estupefato
Não acreditava em seus ouvidos
Ele havia confiado no presidente
Votou seguro, pois achava que este era diferente
Afinal, havia vindo do meio de nossa gente
Simplesmente não podia acreditar.
"Ah mas ele há de me ouvir
Não posso mais ouvir este "não"
Não vim do Espírito Santo
Até o meio do nada, em vão"
José rapidamente arquitetara um plano extremado
Típico de quem está desesperado
E naquele que era seu terceiro e último dia
De sua curta passagem em Brasília
Pensou que encontrara o meio de chamar a atenção
Não só do presidente, como de toda a população
Desse problema terrível que é a falta de ocupação
De fronte ao palácio presidencial
José caminhava todo encharcado
Com um cigarro apagado na boca, se sentia especial
Estava completamente realizado
De seus lábios saía apenas um suave murmúrio final
"... E que o meu sacrifício seja por todos lembrado"
José acendeu um fósforo, e com este, seu cigarro
Deu uma longa tragada, e sentiu uma suave brisa
Por fim, soltou a venenosa fumaça
E deixou cair o fósforo sobre sua camisa
O álcool cumpriu seu papel com eficiência
Deixando o corpo de José sob impiedosas chamas
Este foi o meio dele levar seu recado à presidência
Através da brisa e do fogo chegou ao fim seu drama.
V
Mas nesse mundo globalizado
O que vale a morte de mais um desempregado?
A julgar pelo Jornal da Nação,
Nada mais que um breve comunicado
Espremido entre os comerciais e as notícias do mercado.
"... E não perca! Hoje após a novela, Shit Brother 4".
Pois é José.
Saiba que sua morte não foi em vão
E que tua chama aponta-nos um caminho
Que é exatamente o oposto ao do Marinho
Esse, a causa de toda a nossa servidão |
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