Eu vi a terra tremendo com a seca do sertão
Autor: José Ayres de Oliveira*
Eu vi crianças chorando
Sem ter alimentação
Vi levas de retirantes
Desnudos e pés no chão
Vi pobres pais de família
No bolso sem um tostão
Vi tanta calamidade
Que me chamou atenção
Eu vi a terra tremendo
Com a seca no sertão
Vi gado morrer de sede
E um cavalo descontente
Vi um camponês sentado
Com tristeza em um batente
Fazendas desabitadas
Porque não mora mais gente
Eu vi um povo tão triste
De doer no coração
Eu vi a terra tremendo
Com a seca do sertão
Vi o juriti voando
Pra outras terras distantes
Em busca de alimentos
Outros pássaros avoantes
Vi poeira e terra quente
Ardendo nos pés da gente
Não vi nuvens carregadas
Nem o pipocar do trovão
Eu vi a terra tremendo
Com a seca do sertão
Vi crianças desnutridas
Por não ter o que comer
Falta o leite, falta o pão
E até água pra beber
E o pobre pai de família
Começa a esmorecer
Sua esposa lhe conforta
Dizendo vamos vencer
Vi a seca no sertão
Vi tanta gente sofrer
Vi uma cabra deitada
Na sombra de um oitão
Vi dois cabritos berrando
Fracos caídos no chão
Vi um jumento com sede
Na beira de um cacimbão
Vi um bezerro caído
Magro e sem disposição
Eu vi a terra tremendo
Com a seca no sertão
Vi tanta calamidade
De cortar o coração
E sem poder fazer nada
Por aquele meu irmão
Comecei a meditar
Meu Deus que tanta aflição!
Este pobre que quando tem
Reparte com seu irmão
Hoje está necessitando
E ninguém lhe estende a mão
Terra seca e chão molhado
José Ayres de Oliveira*
Uma cabra deitada no oitão
Dois cabritos com fome perto dela
E coça o queixo na trave da cancela
Um jumento faminto e sem ração
Tem um gato deitado no fogão
E um cachorro latindo na esquina
As galinhas ciscando numa tina
E um porco na terra vai fuçando
Veja o corpo da terra se queimando
Na fogueira da seca nordestina
A terra fica molhada salvando todo sertão
A água que desce em correnteza afora
Carregando folhas que secaram outrora
Matando a tristeza de um povo que chora
Levando garranchos, vasculhos e tora
Vai molhando o chão, renovando a flora
De uma seca cruel que já foi embora.
(*) é natural de Olho D’Agua-PB; foi prefeito interventor do seu município; é poeta, humorista, contador de causos, declamador; é radialista há mais de 40 anos, tendo trabalhado em várias emissoras de rádio, e atualmente na Rádio Líder FM de Santa Rita-PB.