Eu acho que vi a cara da fome. Se ela tiver um rosto, sem duvida era aquele.
Eu estava parado num sinal de transito no bairro de Piedade, (mas haveria de existir um nome melhor para o lugar onde você encontra a fome) e ele pedia esmola no carro da frente. Esquelético. Apático. Por alguns segundo eu pensei que estava na Somália ou na Etiópia, tamanha a miséria que ele transmitia. Vestia apenas um calção velho, o que deixava a mostra o desenho dos ossos. Podia-se ver a fome gritando naquelas costelas e naquele rosto magro.
Não obteve sucesso com o pedido. Acho que o motorista da frente sequer baixou o vidro. Ele tentou caminhar ate o meu carro. Lento como qualquer esfomeado. Parecia ser mas novo do que realmente aparentava. Parecia carregar no corpo desnutrido poucos anos que lhe pesavam como décadas.
O sinal abriu e eu segui sem antes ver aqueles olhos de miséria me olhando por entre a película escura. Segui triste com todo o espetáculo da fome que havia presenciado. Pensando na exclusão social, naqueles que não tem nenhuma oportunidade na vida, que vivem a margem de todos. Conclui que todos nos ignoramos a miséria na qual vive grande parte dos homens e que essa ignorância nos deixa felizes. Preferimos assim. Levantar barreiras para evitar ver a desgraça dos nossos semelhantes era fácil demais. Eu queria mudar isso. Eu poderia fazer alguma coisa. Poderia conclamar os iguais a mim para assistir comigo toda a penúria dos homens. Eu poderia acordar os outros para juntos ajudarmos os excluídos. Ao menos me sentiria melhor.
Segui o meu caminho pensando em ajudar os pobres. Logo cheguei na Avenida Boa Viagem e baixei o vidro do carro para sentir o cheiro do mar e pensar melhor. Tinha que arranjar uma forma de mudar toda aquela situação.
A brisa marinha inundou tudo ao meu redor. Eu vi aquelas senhoras de classe media com os seus lombos gordos caminhando na beira mar. Aquela brisa gostosa!!! Aqueles jovens com os seus cachorros vistosos de pedigree. Os carrões , os prédios magníficos, a brisa...... Relaxei. Deixei de me preocupar
Logo logo eu esqueceria de tudo.
