- Anabela, que maravilhoso jogo de sedução você me apresenta!
- Já vivemos tanto meu bem amado, tantas maravilhas, tanta dor que nos esquecemos das pequenas coisas que podemos fazer na paz do nosso silêncio.
- Como, depois de tantos anos, teus olhos ainda possuem mistérios que a ponte que atravessamos não conseguiu desvendar?
- Lembra de como, um dia, perdidos na beleza do Nilo, vimos a noite chegar contemplando o espetáculo da vida? Como ali, sob a proteção dos deuses nos entregamos pela primeira vez ao apelo da carne?
- No mesmo lugar onde tempos depois, passadas todas as agruras e os tormentos, sob o olhar choroso dos deuses te dei meu sangue e a noite se tornou nossa morada.
Nem mesmo por um instante me arrependi da minha escolha; morreria mil vezes mais para termos momentos como esse, onde, sob a maldição dos deuses e a absolvição dos demônios, contemplamos a paz da treva.
- Façamos o que nos é devido então...
- Que a luz prateada da deusa Lua, guardiã dos segredos ocultos da eternidade, banhe este corpo nu, tão selvagem como o canto da ave que busca o poente.
- Dos teus gestos sou prisioneiro, cativo dos teus beijos pagãos, minha amada imortal, deita em mim tuas mãos, tão refrescantes como a brisa que um dia tocou meu rosto vivo...
- Abro em mim o poço de onde podes dia após dia matar tua sede e contemplar os velhos campos.
- De mim beberás, como um dia perdido no tempo, você bebeu para se saciar do calor de Atom, o deus sol que nos abandonou...
No enlace dos dois corpos tão velhos quanto a própria história, as bocas famintas mergulharam no alimento da nova vida e seus olhos se acenderam em fogo e êxtase, contemplando no ermo, as paisagens perdidas, onde o Nilo, aquele que era a presença dos deuses na Terra e a fonte de vida ao mesmo tempo, servira como esplendido cenário da transformação de desejo carnal para o amor imortal...
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