(para Clarice Lispector)
Débora Cristina Denadai
Brasília, 11 de julho – 23:50h
Ando vivendo, não raro,
momentos de uma clareza absurda.
Estes momentos, é claro,
chegam num lapso, um espaço pequeno,
mínimo, entre o calar e estar muda.
São momentos de uma lucidez extrema,
de uma clareza tamanha,
que como num poema da Clarice,
também me pergunto o que se ganha,
e penso, como ela mesma disse,
que não sei de que me adianta
tanta clareza de realidade,
tanto enxergar o nada,
tanta compreensão do que é verdade.
Ver claro é um risco, uma cilada,
mais fácil é entender a irrealidade
do que a realidade da estrada.
A visão clara abre espaço para o nada,
abre-nos a visão daquilo que é,
fecha a porta do que pensávamos ser.
Ver claro muitas vezes turva a fé
tão cega que pensávamos ter.
Fico, por assim dizer,
no limbo entre o que é e o vir a ser.
Um intervalo milimetricamente pequeno
entre o que sou e o que penso ser.
Perigosa clareza, arriscada lucidez
que impele a sair da acomodação
de viver numa espécie de viuvez
da minha cômoda resignação
de viver no irreal confortável,
de desistir da cegueira de então,
e persistir no imperscrutável.
Insistir na visão do intervalo
pequeníssimo, mas ostensivo,
entre o calado e o que falo,
entre o que sonho e o que vivo.
Como usar tanta lucidez
em meio a tanto (pre)conceito,
em meio à geral estupidez?
Que Deus (ou a Vida) me permitam existir,
persistir e consistir,
no claro e no obscuro,
no estar e no porvir,
na luz ou na sombra escura,
e de mim mesma me rir.
|