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cronicas-->Perdido na Metrópole (9) Uma guerra particular! -- 20/03/2003 - 00:57 (Silvio Alvarez) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Acordei como todos os dias. Abrindo os olhos! Os neurónios teimosos resistiram como sempre! A janela do quarto não resistiu e cedeu à claridade que se espalhou, anunciando o recomeço da continuação do tudo igual!

Porém, um dia diferente dos demais. Tudo leva a crer que dentro de algumas horas terá início uma guerra, um conflito mundial imenso, com consequências imprevisíveis.

Ligo o mesmo rádio na mesma emissora e ouço o mesmo locutor falando para o mesmo ouvinte: eu. As notícias? Também as mesmas: guerra, guerra, guerra, guerra e um assunto mais ameno para terminar, guerra. Entre uma e outra nota de guerra, música. Que bom! Música e paz!

Verticalmente acordado e pronto para sair, ouço uma última canção: Rosa de Hiroshima, poema de Vinicius de Moraes na voz de Nei Matogrosso. Com minha mala 007 já à mão, amoleço. Coloco no chão, aquela que brinco ser a extensão de meu braço e adio a saída sentando à beira da cama. Na voz do cantor os últimos versos. A rosa radioativa / Estúpida e inválida / A rosa com cirrose / A anti-rosa atómica / Sem cor sem perfume / Sem rosa sem nada. Lembro que há exatos trinta e sete anos atrás cheguei a este mundo. É o meu aniversário! E é o dia da guerra também.

Uma lágrima driblou, como Garrincha, a fortaleza que eu vestira para enfrentar o mundo em mais uma jornada de trabalho. Rolou.

Levantei a cabeça, sorri e saí.

Abro a porta do elevador, aquelas de ferro dos filmes Noir, deparo com um vizinho carrancudo. Digo um bom dia generoso! Nada de resposta. Só a carranca. Não resisto e solto com sarcasmo um pedido de desculpas pelo meu bom dia. Surpreso, o cidadão ficou sem graça e pediu perdão. No silêncio sepulcral do resto da viagem, engoli a seco o meu arrependimento.

A caminho do serviço lembro ironicamente do que vivenciei há quatro dias atrás no velho prédio onde moro. Um folheto xerocado espalhado por todo o edifício dizia mais ou menos assim: - Srs. Condóminos, informamos que a partir de amanhã, haverá dedetização no edifício, sendo aconselhável fazer o mesmo em seus imóveis, pois todos os adoráveis bichinhos irão fugir do nosso veneno procurando abrigo em vossas casas. Aceitamos cheques pré-datados. Fim. Isto não é informação, é ultimato!

Na realidade estava mesmo precisando fazer algo a este respeito. Além do incómodo de morar com aqueles bichinhos sob o mesmo teto, meus leitores já estavam mostrando sinais de exaustão no assunto.

Uma amiga veio conversar sobre estes insetos, dias antes. Um problema que temos em comum. A solução que ela encontrou é interessante, mas Paulo Coelho demais. Prometeu aos bichinhos solenemente que não mataria mais nenhum da espécie nas ruas se elas não entrassem mais em sua casa. Diz ela que deu certo! Funcionou! Só que avisou, dentro de seu lar, se o acordo fosse rompido, ela mataria sem dó.

Tentei esta técnica místico-insetisídica! Parei frente a uma delas na rua. Era gigantesca, daquelas voadoras. Iniciei a conversação: -Minha senhora. Sou porta-voz de uma amiga humana colaboradora de uma causa vital para a sua espécie e gostaria que intermediasse o processo de minha adesão ao mesmo movimento. Ela olhou para a minha cara, sorriu e disse: -Cínico! Pensa que a morte de nossa companheira na pia daquela espelunca que chama de lar, na semana passada, ficará impune. Seu calhorda demagogo. Ainda tem coragem de tentar ser amigo?

Depois desta frustração como missionário da paz, a revolta e a ira, até então acabrunhadas no àmago do meu ser, vieram à tona.

Fiquei muito triste! Humilhado, optei pela vingança. Sou o dono daquele espaço! Tomei a decisão mais radical! Causarei uma tragédia! Destruição em massa! Realizarei a tal dedetização em meu apartamento. Não, não, não tem mais volta. Era a minha honra que estava em jogo, meu orgulho! O Genival, meu computador e, principalmente, a Mafalda, minha geladeira concordaram.

Gastei R$ 60,00 do meu PIB nesta operação militar. Dois amigos vetaram. São pacifistas. Cortei relações diplomáticas com ambos. Chega! Precisava pedir autorização a uma tal de organização não sei do que, mas nem quis saber. Eu lá vou pedir autorização para fazer o que quer que seja dentro da minha casa, meus domínios. Eu não! Eu que pago minhas contas!

Com a decisão tomada, na véspera da operação, dormia em paz quando ouvi uns ruídos na sala. Moro sozinho em um kitchnet. Sem chegar muito perto observei aquela cena dantesca. Uma passeata de baratas no meu tapete. Trezentas manifestantes vestidas de vermelho. Carregavam faixas e cartazes. Vi em um cartaz uma foto do meu corpo com a cara de um certo presidente. As faixas diziam: "abaixo ao imperialismo magrela", "viva o macarrão instantàneo". Pensei: elas devem ter lido a confirmação do serviço embaixo da porta.

Chamei a líder da manifestação e tentei dialogar. Aceitou a visita de inspetores nas frestas do apartamento. Pura encenação de minha parte, já estava decidido a efetuar a operação, já estava tudo pago inclusive.

Elas enrolaram, enrolaram e não mostraram nada. Podem transmitir hepatite e outras coisas. São perigosas. São sérias ameaças ao meu poderio. No dia e hora marcados, aconteceu. Sem cheiro e sem sujeira. Em uma ação cirúrgica eficiente acabei com o meu problema. Simples!

Aqui, neste caso, eram apenas baratas!

Silvio Alvarez é assessor de imprensa da banda rock pop Yslauss, artista plástico de colagem e colunista. E-mail: silvioalvarez@terra.com.br Ilustrador: Bruno César panx@uol.com.br
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