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Contos-->Cicatrizes -- 07/11/2003 - 16:28 (Paulo Lima) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

A voz grave ecoou por todo o salão, fazendo tremer os lábios úmidos de álcool:
“ Eu queria te falar. Te encontrar de qualquer jeito”
-- Puta que pariu. Gritou ela, erguendo sobre a cabeça o copo cheio de uísque.
Lutou com todas as forças para não pensar nele. Lutou com o animo de quem entre numa briga perdida. Depois de 20 anos ainda pensava nele. Airton.
“ Pra sentar e conversar, depois andar de encontro ao vento.”
Não o via há alguns anos, quando visitou a sua família no interior. Ele estava casado e com filhos e ela deixando pedaços de si pelo caminho. Não era completa, faltava-lhe Airton. Ele dizia que era para sempre.
Largou na mesa o copo, não antes de um farto gole, e levantou-se com os braços abertos como numa cruz e esperou o sangue verter das chagas ainda abertas. Vinte anos. Tivera alguns homens, mas não como Airton. Não aquele amor de verdade que lhe corria gelado pela espinha. Não aquele olhar. Aquele olhar de Airton.
“......o mesmo ar que te rodeia.”
No rosto quase meio século, na alma muito mais do que isso. Não entendia ainda o fim daquele amor. Tão completo. Tão soberbo. Tão cheio de eternidade. Por que Airton ? Por que ? Ele não estava mentindo quando dizia que era para sempre. Não! Ela sabia que não, pois lhe olhava no fundo dos olhos quando ele falava. Perdia-se naquele lago castanho largo.
A voz grave insistia em lhe aguçar a dor e cada nota, e cada vibração daquele som, lhe ardia na pele. Como que queimada a ferro e fogo, marcada e ardida. Ainda ardia aquele amor por Airton. Cantou junto. Alto e forte.
“..... o mesmo sol de te bronzeia”
Rodopiou pelo salão mas não conseguiu fugir das lembranças como desejava. A pele morena de Airton ainda estava ali a roçar na sua. O seu suor ainda banhava Airton, como nas noites de gritos e gemidos abafados. Os lábios de Airton ainda rosavam em suas orelhas, o aroma do hálito ainda lhe invadia as narinas.
“.... ver o sol amanhecer.”
Tonta de dor e de álcool, sentou-se surda. Ignorou a voz que ressoava sua lamurias e deixou-se estar imóvel. Perdera a vida na saudade. Perdera a vida zombando da sua solidão. Restou-se imóvel que sempre foi depois de Airton.
Com o dedo fez dançar as pedras de gelo que não mereceram o seu olhar triste e perdido. O salão estava cheio daqueles que ainda viviam ou fingiam viver mas ela nada via. Trancada na sua amargura, banhada num lamento longo e elástico como sangue. Num gole rápido secou o copo. Ergue-se novamente a vida, bêbada e sozinha.
Seguraram-lhe os braços e puxaram-lhe ao salão. Deixou-se levar. Colada no corpo de homem pensou em Airton e dançou. Acordou. Não era a mesma pele, não era o mesmo cheiro. Nunca seria o mesmo amor. Nunca. Perdera-se há vinte anos aquele frio na espinha. O arrepio da paixão ficou na lembrança.
“..... faz de conta que ainda eh cedo...”


Paulo Lima
07/11/03

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