ATÉ SER DIA... Da conversa da noite e da madrugada, em harmonioso convívio com meu amigo Lira, trouxe registo de que em São Paulo se reproduz a mais deliciosa piza do mundo. E veio piza para a mesa como se sob aragem paulista a ceia decorresse, regada a tinto do Dão à temperatura ambiente em autêntico surf de lábios entre ondulante fumarada plena de odores indefinidos. O louco da sala oval, aumentando o fedor ao recinto dos comensais nocturnos, cuspia palavras sobre as ondas de Hertz. Ali estava o lídimo aluno do mundo a transmitir as grandiosas ideias do professor legítimo, seu progenitor com honrado e reconhecido orgulho cívico por ter levado o miúdo além do poder de todos os antigos deuses do planeta. - Mas... Lira - aventei eu - a piza é italiana... - É... É... E inclinada, Torre, inclinada... Como consta, apesar de ceder um milímetro por ano, não há meio de cair e a besta semita incha cada vez mais. O Brasil está no Porto e Parreira não quis dizer absolutamente nada sobre Scolari e Deco, embora seu sorriso quisesse dizer tudo. No meu bloco em branco anotei: mais um jeitinho adiante e para a próxima teremos um Brasil-Brasil no novo Estádio Jorge Nuno Pinto da Costa, quem sabe, com uma opípara e pizante feijoada à brasileira para revigorar as sádias energias exauridas na jogatina. O Lira, de olho em canto, leu e replicou: - Também o feijão, Torre, o feijão não é brasileiro, meu querido. Nem o peido... - Ei... Lira, estamos a comer piza... - Pois estamos e os italianos que me desculpem, mas até o Lula foi apertar a mão ao Bush. Bem... Guardei o bloco e a esferográfica... Que raio... Que recordação tão incómoda me passou nos neurónios. Sitiado em meus olhos o Lira ergueu o copo a tremelicar de Dão auspiciosamente vermelho... - À nossa, Torre, à nossa, sempre, sempre... A sala estava cheia, cinco da manhã e Babel zaragatava vaporosamente. Os lábios do Lira pintavam-se... Que pictórico surf no mar da noite... Até ser dia ! Torre da Guia |