Sento-me na pedra fria. Parece emanar calor. No esforço para o sorriso, há uma contração na face e as rugas afloram. Olho ao redor. Não há seres humanos. Em vão procurei o homem, a justiça, o amor. Meus olhos muito abertos não piscam, estão secos. Meus lábios destilam palavras desconexas, duras, acres. Encomendei flores, chegaram espinhos. No fundo do poço, minha imagem em círculos berra silenciosa. O eco se espalha doloroso rasgando a pele, perfurando a carne, sangrando. O veio vem moroso, quase parando, interceptado pelas pedras. São muitas e pontiagudas. O tempo, ourives imperdoável, fará seu trabalho lentamente. Sei que não verei a beleza da pedra lapidada. É o destino. A felicidade só nos finge. Miragem do navegante cansado, delírio do corpo febril. Eis a sociedade dos vivos! “Vana verba”. Razão do meu calar consciente, sabedor de que o sorriso disfarça tragédias profundas. Os resíduos nunca são limpos. De lanterna acesa percorro o mundo interior vasculhando o inconsciente. Tenho os olhos voltados para dentro. Vejo o avesso. Assim é melhor. Não me assusto com meus próprios passos. Em devaneio vejo um desfile diante dos olhos cerrados, ao som torturante do silêncio. Hora em que Deus e o demônio têm o mesmo rosto. A humanidade parece ter a face voltada para o rochedo. O homem esmaga a cabeça de um corpo inclinado diante de uma pequena flor. O leão lambe seu filhote, os pássaros voam ansiosos em busca de ramos secos. As flores espargem perfume e colorido. Provocando um sorriso erótico no girassol, o sol derrama-se todo. Com ondulações, o lago é a pista de dança dos patos, que deslizam afundando, de quando em vez, a cabeça na água. Um leve sacudir no arvoredo e o chão fica recamado de folhas. A natureza contrasta com o homem. Olho para a cidade umedecida pelo choro. Sinto náusea. Se pudesse escolher, seria apenas brisa.
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