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cronicas-->5 minutos -- 15/04/2003 - 12:29 (Marcos Woyames de Albuquerque) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
5 minutos

Uma mulher pequena, menos de um metro e meio.

Em meio à escuridão, tateava o chão com os pés. Braço direito estendido numa tentativa de proteger-se de possíveis obstáculos. Entretanto, seus movimentos guardavam a segurança de quem sabe o que faz.

- Com licença senhora, posso ajudá-la?

Foram estas as minhas primeiras palavras. Aquela mulher me pareceu frágil em meio a multidão de passantes.

- Aceito senhor, preciso atravessar a rua e chegar até a drogaria.

Sua voz suave e firme... Alguém que sabe o que faz!

Mudei completamente meu rumo. E, no sentido inverso da minha direção, ofereci-lhe meu braço direito.

Caminhamos lado a lado.

Começaram ali cinco minutos de vida.

A pequena senhora foi quem tomou a iniciativa da conversa agradecendo meu gesto. Não havia necessidade, meu coração já havia sido tomado pela paz de espírito determinante a quem presta ajuda apenas pela ajuda.

Me sentia bem com meu próprio gesto.

Junto ao meio fio, de braços dados, aguardamos o trànsito parar.

O som de sua voz, a cada segundo, encantava meus ouvidos. Mais do que sua voz, sua lucidez encantava meu senso.

Nos poucos passos até aquele ponto de nossa curta caminhada e durante o período que ficamos ali aguardando os carros passarem, me falou da perda da visão, das dificuldades e adaptação de vida para que caminhasse sozinha na rua. Falou-me do seu escuro mundo.

Por alguns instantes um raio do passado me veio a cabeça. Eu havia passado por experiência anterior. Um rapaz, recém transferido para meu local de trabalho. Garanto, não tinha sido a melhor de minha vida.

Logo no segundo dia de sua chegada, ao me aproximar do prédio da empresa, o percebi do outro lado da rua. Prontamente me aproximei e ofereci ajuda. A resposta que obtive foi no mínimo deseducada e me fez ficar, por muito tempo, reticente em relação ao meu gesto.

Foi "flash" de lembrança.

A senhorinha não parava de falar.

O trànsito finalmente nos permitiu atravessar.

Já não falava mais de si, nem de sua escuridão, falava da vida, do mundo.

Falou da guerra no golfo, da violência dominando nossa cidade.

Olhei a minha frente e um mar de barraqueiros e seus "negócios", indistintamente espalhados pela calçada. Imaginando os inumeráveis obstáculos que iria atravessar, resolvi acompanhá-la até seu destino, no meio da quadra.

Fiz questão de informá-la que o faria e por qual razão. Mais uma vez me agradeceu.

Assumindo postura de conhecedora, dissertou sobre a dificuldade de emprego e a política do governo; dos problemas e da solução deles na educação e principalmente, de sua preocupação com o futuro das novas gerações.

Lamentavelmente chegamos a nosso destino. Ofereci mais ajuda, mas educadamente ela recusou.

- O senhor deve ter família e não vou mais incomodá-lo.

Antes que se afastasse lhe falei de minha admiração por sua lucidez e a forma como se mantinha atualizada. Sua resposta me deixou mais admirado que antes.

- Veja bem, meu senhor, o mundo como está, o rumo que a ele estão dando, me deixa numa terrível dúvida, quem é o cego? Eu ou aqueles que se julgam absolutamente donos da verdade?

Dito isso, virou de costas e, tateando com os pés e com o braço direito estendido, navegou perfeitamente entre as góndolas e balcões da grande drogaria.

Fiquei parado ainda por alguns segundos. Dentro de mim uma sensação de agradecimento por aqueles cinco minutos e pela lição de vida.

Quer falar com o autor? Escreva para mwoyames@ibge.gov.br
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