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Contos-->O SEQÜESTRO -- 26/12/2003 - 10:33 (Edmar Guedes Corrêa****) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O SEQÜESTRO

Quando o Sr. Valdomiro levantou para mais um dia de trabalho, não imaginou que aquele dia seria um dia diferente de todos os outros, um dia que mudaria para sempre o destino de si próprio, de seus familiares e de seus amigos. Pois ele se levantou e seguiu o mesmo ritual que fazia todos os dias. Não havia motivos para que aquele dia fosse diferente; mas foi...
Sr. Miro, como era mais conhecido, era um grande empresário, dono de uma rede de lojas de magazine no estado de São Paulo. Era um homem idoso, mas até bem conservado para os seus sessenta e quatro anos de idade. Dirigia com afinco sua rede de lojas. Às vezes, era visto no mesmo dia em meia dúzia delas. Acompanhava os novos lançamentos e rapidamente as novidades apareciam nas prateleiras de suas lojas. Possuía dois filhos homens, todavia, somente o mais novo levava jeito para administrar as empresas do pai. O mais velho entrara para o mundo artístico e, apesar de carregar o nome do pai, ainda não passava de uma promessa.
Após o café, Sr. Miro saiu em seu Audi rumo ao trabalho. Não dispunha de segurança, somente de um motorista particular; uma vez que não gostava de sentar ao volante. Preferia usar o tempo no veículo para examinar os relatórios de vendas das filiais.
Apesar da grande fortuna, ele era um homem reservado. Não bebia, não fumava, não era visto na companhia de mulheres e vez ou outra era visto em festas. Na verdade, era um homem obstinado pelo trabalho. Por isso, quando saia do trabalho, por volta das nove da noite, voltava direto para casa.
Mas naquela terça-feira ele não voltou.
Cerca de dois quilômetros de casa, o seu carro foi fechado por outro veículo. O motorista ainda tentou fugir, mas foi atingido mortalmente por três disparos no peito e na face. O carro desgovernado acabou atingido um ponto de ônibus e parou quando bateu no muro de uma casa. Sr. Miro nada sofreu; todavia, três homens armados e encapuzados saíram de outro veículo que os acompanhava e o arrancaram de seu carro. Em seguida, anunciaram o seqüestro e o obrigaram a entrar no outro carro.
Já era noite, e a ação foi muito rápida. Talvez alguém tenha assistido a ação; todavia, alguns instantes depois os que acorreram para ver o acontecido chegaram a concluir que tudo se tratava de um mais um assassinato.
Assim que foi colocado no carro dos seqüestradores, fizeram-no inspirar um produto químico que o deixou desacordado por mais de uma hora. Quando acordou já estava acorrentado no cativeiro.
O lugar em que foi deixado, era um pequeno cubículo de aproximadamente dois metros quadrados. No local havia um colchão velho e uma pequena mesinha. O ambiente além de muito escuro, não possuía ventilação alguma. Talvez devido ao horário, não se ouvia som algum vindo do lado de fora.
Quando ele acordou, e então a lembrança do ocorrido foi se recompondo em sua memória, se deu conta do ocorrido. “Meu Deus! Fui sequestrado!”, pensou ele.
O pior momento na vida da vítima de seqüestro são as primeiras horas. Muitas vezes a pessoa tem a sensação de que será vítima de terríveis torturas e será assassinada em seguida. O que às vezes é a realidade. O que causa mais desespero a pessoa é a falta de informações -- quem o sequestrou e por quais motivos? -- A expectativa de um primeiro contato com os sequestradores contribuiu em muito para um desgaste psicológico da vítima.
E durante muito tempo, Sr. Miro ficou sedento e aprisionado naquele quarto sem que alguém entrasse em contato. Durante esse tempo, pensou muito na velha esposa e nos filhos. Era um pai que não dispunha de tempo para os filhos, mas, naqueles instantes, sentiu saudade e muita vontade de abraçá-los e dizer-lhes o quanto os amava. Há muito que não sabia o que era chorar, porém as lágrimas jorraram abundantemente.
Ele não sabia há quanto tempo permanecera desacordado. Por isso perdera a noção do tempo. Não sabia se ainda era noite ou se já havia amanhecido. E muito depois de ter despertado é que finalmente alguém apareceu para lhe trazer algo para comer.
Quando a porta abriu, surgiu um homem encapuzado com uma arma na mão e em seguida uma mulher trazendo uma garrafa de água mineral, uma coca-cola e um pacote de bolachas.
-- Fique queitinho aí, vovô!-- disse o homem, apontando-lhe o revolver.
A mulher deixou o que trouxera sobre a mesa e saiu sem dizer uma única palavra. Em seguida, a porta foi novamente trancada e o silêncio voltou a reinar no local.
Mais tarde, a porta foi novamente aberta e dois homens encapuzados entraram. Ele não sabia se aqueles homens eram os mesmos que o havia seqüestrado. A única coisa que sabia era que não estavam ali com boas intenções.
-- Eh, vovô! -- disse um dos homens. Pela voz, Sr. Miro, viu que aquele não era um dos que o sequestrara. -- Parece que o pessoal lá de fora não quer colaborar direito. -- Em seguida, fez ameaças. -- Parece que vamos ter que mandar um bom recado para eles.
-- Mas o que vocês querem? -- arriscou a perguntar, um tanto temeroso. A dúvida de não saber ao certo o que estava fazendo ali era pior do que o risco que teria que correr.
-- Isso não é da sua conta, velho! -- disse o homem. A voz parecia ser de uma pessoa de meia idade. Era uma voz grave, sem sotaque, deixando perceber que pertencia a um paulistano. -- Mas se não derem o que queremos, vamos fazer uma peneira do senhor.
-- Precisamos de algumas informações bem pessoais para mostrar aos seus parente de que o senhor está vivo -- falou o outro homem, cuja voz ele também não tinha ouvido.
Sr. Miro teve que fazer um grande esforço para conseguir lembrar de detalhes conhecidos somente pelos familiares. Por fim, acabou contando coisas sobre os filhos e intimidadas das esposa. Detalhes que jamais contaria se sua vida não tivesse em perigo.
Passou-se muito tempo até que alguém viesse lhe trazer comida. Junto com um marmitex, trouxeram também um penico e um rolo de papel higiênico. Isso mostrava que ele nem mesmo poderia sair dali para fazer suas necessidades.
Ele tentou dormir, mas não conseguiu. O pior de tudo era ter que ficar preso aquela cama sem ter o que fazer. Logo ele que era um homem que não sabia ficar sem fazer nada. Sentiu vontade até mesmo de um jornal para ajudar a passar o tempo.
Durante muito tempo vinham e lhe traziam comida. Aos poucos, ele conseguiu descobrir que primeiro vinha o café da manhã, depois o almoço e depois o jantar. Ao lhe trazerem o jantar, os penicos eram trocados. Com isso, ele passou a contar o tempo. E assim, descobriu que estava preso naquele lugar a quatro dias.
Por três vezes, tentou se informar com a mulher sobre o andamento das negociações, contudo ela dizia não saber de nada. E essa falta de saber o que estava se passando inquietava por demais seu espírito. Queria saber notícias da família, mas também isso lhe negavam.
Até o sexto dia, não sofrera agressões físicas; todavia, algum tempo depois do almoço, dois homens entraram pela primeira vez no quarto sem capuz. Ambos estavam armados e pareciam aborrecidos.
-- Vamos convencer sua família a ceder, seu velho filho da p... -- disse o homem de estatura mediana, forte, aparentando ser o chefe do bando. Em seguida, deu-lhe alguns chutes.
Logo depois, entrou outro homem com uma barra de metal na mão.
-- E aí, vamos fazer um estrago no velhinho? -- perguntou ele para os outros.
-- Depois a gente manda a foto para eles. Quem sabe assim eles se convençam de que não estamos de brincadeira -- disse o mais franzino dos três. Era um homem magro, alto, de cabelos negros e barba por fazer.
-- Pode começar -- ordenou o mais forte e mais velho.
O Sr. Miro foi espancado durante cerca de dez minutos. A barra de ferro lhe atingia aleatoriamente todo o corpo. No começo, foi terrível, mas aos poucos foi aceitando passivamente a violência contra seu corpo, como se fosse um espectador, como se sua alma estive fora de seu corpo. Tentou manter-se consciente o maior tempo possível, todavia acabou perdendo os sentidos.
Quando acordou, havia hematomas por todo o corpo, sua roupa estava manchada de sangue, e, ao passar a mão pelo face, sentiu o sangue coagulado. Sentiu também o gosto de sangue, e descobriu que lhe faltavam alguns dentes. Os lábios pareciam muito inchados. Seu corpo doía muito, mas a dor de cabeça era insuportável. Sentia uma enorme sede. Com dificuldade conseguiu beber um pouco de água.
Mais tarde, a mulher lhe trouxe comida; todavia, nem mesmo se deu ao trabalho de se informar acerca de seu estado.
Ele quase não dormiu nos dois dias seguintes. Durante esse período teve febre constante. E o máximo que lhe trouxeram foi um tablete de analgésico.
Com o passar dos dias, seu estado de saúde foi piorando. As feridas nos lábios infeccionaram e ele tinha muita dificuldade em se mover. Por isso, passava quase a maior parte do tempo deitado. Sua aparência se tornara assustadora com os longos cabelos desgrenhados e a longa barba. O estado de suas roupas também contribuíam para o seu estado deplorável.
E durante longos dias ele não viu outra pessoa, a não ser a mesma mulher que lhe trazia as refeições. Essa espera, sem saber o que se passava, ia destruindo-o pouco a pouco. Já não tinha mais esperança de sair com vida desse episódio.
Passaram-se mais uma semana sem que algo de novo viesse a mudar aquele trágica rotina. Dia a dia ele sentia suas forças esvaírem-se. Já não se preocupava mais com o mundo lá de fora. Tudo não passava de lembranças, de um passado distante, de algo que não pode ser retornado. E isso fazia com que ele desejasse o trágico final a essa longa e angustiante espera.
Os ferimentos haviam melhorado consideravelmente. Vez ou outra sentia dor de dente, mas nem mesmo isso o afligia tanto. Tanto é que conseguia se alimentar com mais facilidade. Não comia porém por prazer. Alimentava-se mais por instinto de sobrevivência do que por vontade própria. E assim os dias transcorriam.
Certo dia, um dos homens -- que ele vira quando foi aprisionado naquele quarto -- apareceu. Entrou com um revolver na mão e foi logo dizendo:
-- Levanta, velho! Vamos dar um passeio!
Um outro homem entrou logo em seguida e retirou a corrente amarrada em seus pés. A muito custo, ele conseguiu se levantar e caminhar em direção à porta.
Quando saiu viu que era de noite.
-- Vocês estão me libertando? -- arriscou a perguntar.
-- Estamos! -- respondeu um dos homens de forma ríspida, como se aquela pergunta o incomodasse.
Em seguida, foi colocado no porta-malas do carro estacionado na garagem da casa.
O carro andou por quase meia hora. É claro que para o sr. Miro aquilo pareceu uma eternidade. Ele ouviu os dois homens descerem do carro e se afastarem; ouviu vozes, mas não pode identificar o que eles discutiam.
Instantes depois ouviu-se tão somente disparos atingir o porta-malas do carro. Sr. Miro foi atingido mortalmente e perdeu os sentidos imediatamente.
Foi encontrado morto pela polícia ao amanhecer.
A família havia pago o resgate na tarde do dia anterior. O valor era a metade do que estavam pedindo no início. Foi um choque muito grande para seus entes queridos a notícia de seu falecimento. Estavam todos aguardando a sua libertação.
-- Meu pai trabalhou tanto para levar uma vida confortável, e quando estava na hora de parar e aproveitar o resto da vida, tem uma morte trágica dessa. Teria sido melhor se tivesse trabalhado menos e ganhado menos dinheiro, talvez assim ainda estivesse vivo -- lamentou o filho mais novo, após o enterro do pai.

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