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Contos-->VIDA E MORTE -- 25/09/2003 - 05:12 (ADELMARIO SAMPAIO) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
VIDA E MORTE


Dois homens, Adão* e Renato**, encontraram-se a caminho de uma visita, aparentemente andando na mesma direção. Visitariam um conhecido comum, que estava convalescendo em um leito de enfermidade.
Mas quando porém falaram um com o outro, mostraram que seus caminhos eram opostos, como só se fazem nos corações, ainda que percorram juntos a mesma estrada. Porque embora afirmem o contrário, os homens conhecem que se desentendem somente quando falam.
_ Dizem que o nosso amigo está muito mal, e talvez nem passe dessa noite, - disse Adão. E continuou: - Vou levar uma mensagem para ele, pois pode ser a sua última oportunidade que terá de decidir-se por um caminho melhor depois da morte que se avizinha. Essa doença deve ser um castigo, pois já ouviu muitas vezes, e com o coração endurecido, não quis aceitar...
Renato ouviu com a atenção que se ouve quando se interessa por um destoante discurso, e depois de um instante, falou com convicção e firmeza:
_ Não... O meu amigo não está mal assim... Porque mesmo que a morte ronde os seus passos, e as sombras queiram encobrir os seus olhos, ele há de ver os raios de um novo dia que o espera...
_ Você é de alguma nova seita? – atalhou Adão.
_ Bom, digamos que eu creio em Deus...
_ Bem, mas todos dizem crer em Deus, especialmente quando vivem as dificuldades... Qual a sua denominação? – interrompeu novamente o homem.
_ Não conheço nenhuma denominação... Digamos que os nossos passos são conduzidos acima das montanhas, e os nossos pés, cavalguem as nuvens...
_ É, mas está escrito que os que crêem precisam congregar...
Renato calou-se, como quem sabe mais que as palavras podem dizer, e como quem entende mais que a fala. Sabia que não adiantaria discutir. Mas o seu silêncio foi uma resposta interpretada pelo outro homem, como se houvesse calado a boca do inimigo.
E seguiram em silêncio, e ele era a separação, porque o silêncio das contendas leva cada um às suas razões, e as razões por vezes, separam como distância eterna de céus e infernos.
E assim chegaram à casa do doente, e foram conduzidos ao quarto de dor e agonia. Souberam que assim que havia passado várias noites sem dormir, mas que finalmente havia reagido, e apresentava visíveis melhoras. Estava até dormindo, depois que a febre cedera.
Adão e Renato contemplavam o semblante do rosto com as marcas da luta travada contra todas as sombras de morte que rondam os leitos, como se fossem corvos que percebem de longe a fraqueza de suas vítimas.
Eles olharam ao redor, e viram outras pessoas de expressões cansadas, que por certo espantavam por dias e noites, as sombras que teimavam em querer pousar seus pés no corpo sem forças do homem. E era fácil notar que apesar do estado de ânimo abatido, havia um quê de vitória no ar, e todos já contavam com ela, como é a esperança de todos os que lutam essa luta.
Quando o doente abriu os olhos em intervalos curtos, Adão se aproximou, abriu um livro, e falou palavras rápidas, mesmo sem ser de todo entendido pelo doente. Houve um pequeno mal estar entre os presentes, que impacientes esperavam que ele se calasse, para que a vida se instalasse no descanso, e a paz reinasse no silêncio.
Mas o homem com o livro aberto, falou por mais um desconfortável tempo, num discurso ensaiado, e cheio de um sotaque de ameaça e morte, que permeiam as bocas de todos os mensageiros dessas palavras mais abundantes de emoções que de sabedoria. E ele continuaria por muito mais tempo, não fosse a intervenção de um dos presentes, que paciente e delicadamente, pediu para que deixasse que o descanso viesse em paz e silêncio tomar conta do corpo já golpeado pelas bofetadas da luta.
Adão escondeu a irritação, e encerrou a visita, com uma oração que parecia mais uma parte não dita do seu sermão, na qual dizia que os corações endurecidos fossem amolecidos com o óleo das palavras que ele dizia... Depois saiu escondendo novamente a certeza de que uma ameaça pairava sobra as cabeças de todos os que ali estavam, e que a morte rondava por perto, e se apoderaria de quem era-lhe mais propício...
Finalmente todos saíram porque estavam muito cansados, e Renato ficou só com o amigo por um momento, velando por esse instante, e contemplando seu rosto viu quando a vida se instalou, e quando o novo dia clareava a face restabelecida da nova aurora de vida... E viu ainda quando os olhos foram abertos, e a luz brilhou neles, e quando o rosto se iluminou mais ainda num sorriso tênue, mas significativo.
Então estendeu a mão, e tocou carinhosamente a do amigo, e sorriu também, e disse:
_ Acorda para esse novo dia, amigo. Enfrentamos a Morte nessa Noite, mas ela se afastou descontente porque não suporta a luz quando ofusca sua visão... A Providência nos livrou de ouvirmos seus apelos. Agora, quem apela é a Vida, com seus braços ternos e fortes, a nos acenar com gestos suaves... Ouça amigo, os novos sons desse terno e eterno convite...
O doente reuniu forças, e apertou a mão do amigo, e sussurrou:
_ A vida é mais forte que a morte. Fingi estar dormindo, para não ouvir os apelos de quem sopra esse hálito podre de Morte nos rostos de todos... Ela não terá mais nenhum poder sobre os filhos da Vida que renascem como o Sol de um novo dia...
Renato, o mensageiro da vida, ficou contente por ouvir o que ouvia, e percebeu que o amigo adormeceu num descanso calmo, e ficou ainda por um pouco a meditar no significado do seu próprio nome... Renato...

**
[*Adão, significa o filho da terra; **Renato, renascido]
Adelmario Sampaio
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