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Contos-->Manuela -- 09/01/2004 - 21:36 (Barbara Amar) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Manuela lançou a pergunta com a naturalidade de uma vizinha pedindo a receita de um bolo especial:
- Amanda, como é que você dá a bunda?
Pega de surpresa, dei uma gargalhada e respondi:
- Semana que vem te respondo.
- Que é isso, mulher, tá louca? Vai dizer que não gosta.
- Olha pra minha cara e repete esse sacrilégio. (gargalhada)
- Então me conta, vai.

Manuela, 30 anos, ficara famosa recuperando ombros avariados. Dona de um elaborado currículo de Fisioterapia, com direito a mestrado e doutorado na Inglaterra etc (esses títulos impressionam os clientes), era boa de verdade. Procurei-a, indicada por amigos, para tratar a Síndrome do Impacto, ou seja, uma dolorosíssima tendinite do manguito rotador, ô nome pomposo, adquirida no embate diário (e inútil) travado contra o envelhecimento.
Gostei, de imediato, do seu jeito alegre e espontâneo muito parecido comigo. Conversando, descobri que fora bailarina em Belo Horizonte e eu, bailarina de alma e coração, me vi frente a um clone meu.
- Só falta você dizer que é Sagitário.
- Sou.
Amor à primeira vista. Extraordinária empatia. Ficamos amigas; mais que isso, íntimas. Enquanto me tratava o ombro descrevia suas performances sexuais com o marido e falava da vontade de engravidar. Estimulada, a moça aqui, tremenda apreciadora de histórias pouco recomendáveis para menores, passou a lhe detalhar lances incomuns da sua vida amorosa.
- Sabe que sua vida daria um filme?
- Pornô, respondia eu, irreverente.
Manuela era como uma filha para mim. Dizia isso à ela todo instante.
- Não te vejo como mãe, Amanda. Você é minha “ídola”. Quero ficar com o corpo igual ao seu, quando tiver sua idade.

Na semana seguinte presenteei-a com um conto meu: “Sodomizada”.
- Nossa (arregalando os olhos).
- Você não me perguntou como eu fazia sexo anal? Taí a resposta.
Tornou-se minha fã ardorosa. Lia tudo, até as poesias incipientes, emocionando-se com os contos tristes de finais melancólicos e, engraçado, apesar de jovem, assustava-se com minha forma de escrever:
- Você não acha arriscado se expor dessa maneira?
Gostava de saber que ela me admirava. Não cansava de elogiar minhas roupas, o cabelo, os cuidados para me manter em forma e, sobretudo, meu tesão (a seus olhos, inimaginável numa mulher da minha idade). Como disse, era a filha que não tive.

Hoje estamos afastadas. Aparentemente magoou-se com minha franqueza (não fosse ela igual). Espantei-me com sua insensibilidade quando me despachou com raiva infantil, talvez por se ver confrontada com algo que no fundo a incomodasse. Acredito até que devia se questionar a respeito e minha simples observação, feita com a melhor das intenções, desencadeou uma resposta desmesurada (não adianta, não vou abrir aqui o motivo do desentendimento; assunto particular, só diz respeito a ela como profissional).
- Manuela, estou doente (havia rompido, em parte, o mais importante músculo do ombro. Do outro ombro!)
- Pois é. Tô trabalhando pra caralho e ainda ia ficar sem almoçar pra te atender. Você não tinha o direito de me dizer aquilo.
- Sabe o que você tá fazendo comigo? (chorando) Tá dando um soco na minha alma. Pra mim você sempre foi uma filha (pranto redobrado).
- Pra você ver; as coisas são assim (gélida).
-Tá bom, Manuela (engolindo o choro). Não se preocupe, nunca mais telefonarei para você. Caso precise de mim pode me procurar (mãezona).

Nunca mais nos vimos. Tratei-me com uma jovem recém-formada que conseguiu reverter o quadro em tempo recorde. Ainda penso muito em Manuela. Sendo tão semelhantes é provável que ela também pense em mim. Mas os jovens são diferentes, têm seu mundo próprio. Devo ter sido um efêmero raio de sol em sua vida, muito pouco diante de tantas estrelas a sua volta.

Rio, 09/01/04


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