QUANDO O AMOR NÃO ACABA - capítulo VIII
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VII
Se terrível foi a separação, pior foi agüentar até o próximo encontro. Naquela noite custei a dormir. Na verdade eu não queria dormir com medo de que tudo não passasse de um sonho. Fiquei deitado na cama revendo todos os momentos que passei naquele dia com Diana. Eu via o brilho em seus olhos; um brilho intenso, tão intenso que me cegava de paixão. Eu também me recordava de cada gesto, cada palavra, cada detalhe. E ainda hoje sou capaz de me lembrar deles como se os fatos tivessem passado no dia anterior. E quanto mais eu pensava em tudo, mais meu coração se enchia de ternura, de paixão.
Eu não tinha pensamentos para mais nada. Eu só desejava que o dia seguinte chegasse o mais breve possível para estar junto dela. Eu devaneava com a possibilidade de um reatamento completo, com a possibilidade de achar um meio de torná-la minha única namorada, com a possibilidade de retornar amiúde à Santa Paula para estar junto dela. E foi perdido nessas ilusões, nesses devaneios que acabei adormecendo.
No dia seguinte, tomei o ônibus de volta à Santa Paula. E ela já estava a minha espera no ponto de ônibus. Via-se o seu estado de afetação com o meu atraso, com o ônibus que teimava em não chegar no horário. De longe eu a vi inquieta, como se a incerteza da minha chegada a deixasse perturbada. Mas depois, quando ela me viu, houve um sorriso, um sorriso como eu nunca tinha visto naquele rosto. E seus olhos brilharam e a felicidade emanou-se, e atingiu meu peito, e cobriu meu coração. E eu também sofri os efeitos daquele momento e me senti mais apaixonado, mais encantado do que nunca por ela.
Ah, querido leitor! Que o mundo acabasse naquele, mesmo assim eu teria morrido como o homem mais feliz da terra. Se naquele momento, eu precisasse decidir minha vida, fazer minhas escolhas para o resto da vida, certamente eu teria ficado com ela e jogado tudo para o alto. Eu teria abandonado minha namorada, minha família e tudo o mais. Por sorte ou por infelicidade, não tive que fazer escolha alguma. E quando eu as tive que fazer, acabei por fazer as escolhas erradas. Mas não vamos falar disso agora, tudo tem o seu tempo.
Não seria fácil passar o dia com ela, pois Diana tinha seus afazeres e não poderia ficar o tempo todo comigo. Todavia, quando uma mulher quer se encontrar com um homem, nada é capaz de impedi-la. E foi o que aconteceu.
Para evitar embaraços, pois não era bem quisto por seus familiares, procuramos nos afastar de sua casa. Fomos caminhando até a outra extremidade do lugarejo, onde se vê poucas casas, a maioria fechadas como se estivessem abandonadas. E ali, ora sentados num tronco de madeira, ora caminhando de mãos dadas para lá e para cá, ficamos falando de nossos sentimentos, da saudade, da distância e da dor.
Diana não falou muito de si. O pouco que disse foi com minha insistência. Eu, ao contrário, narrei-lhe tudo que havia de mais importante; inclusive que não fui eu quem lhe escrevera aquela carta terminando tudo.
-- Eu sabia que não tinha sido você! Não era com as mesmas palavras e do jeito que você me escrevia – disse-me ela, quando lhe contei a verdade.
Também fui sincero quando lhe disse que, por causa do envolvimento com Joana, eu achava que havia deixado de amá-la. Ela por sua vez aceitou minhas justificativas, ou pelo menos deixou essa impressão naquele momento.
E antes que pudéssemos desviar o assunto e para matar minha curiosidade, eu lhe perguntei sobre as cartas que havia lhe escrito.
-- Você ainda tem todas as cartas que te escrevi?
Diana respondeu afirmativamente. Inclusive que as mantinha como algo muito especial, como um tesouro.
-- E você tem as minhas?
-- Tenho sim. Só aquela, que a Diana pegou que não está comigo. Ela quis pegar as outras, mas dei um jeito de escondê-las. Não sei por quanto tempo, mas, às vezes, tenho medo de que ela descubra.
-- Mas por que você tem medo? Você não me disse ontem que não a ama mais?
Fiquei vermelho e um tanto desconsertado. Eu não esperava cair em contradição. Não que eu estivesse mentindo. A coisa não era tão simples assim. Se por um lado, eu dizia que não sentia nada por Diana, era porque naquele momento isso era verdade, contudo, o meu subconsciente reagia de outra forma. Era como se não só Diana fosse minha namorada, como também, ao voltar, minha vida seguiria o ritmo normal, como se nada tivesse acontecido.
-- Disse sim. E é verdade! Mas como ainda não me separei dela, há a possibilidade de venha a descobrir as cartas.
-- Ah,sim! Mas então tome cuidado para que sua namoradinha não descubra. Senão ela vai ficar com muita raiva – falou ela com deboche, irritada e deixando transparecer uma certa pitada de ciúme.
Fiquei sem saber o que fazer. Por isso calei. E por algum momento o silêncio reinou absoluto no nosso meio. Talvez teria posto tudo a perder se um de nós dois não quebrasse o silêncio. Eu tentava encontrar uma palavra, uma frase para dizer que não complicasse mais as coisas. Mas eu tinha medo de dizer qualquer coisa. Por sorte, Diana passou por cima de seu orgulho e quebrou o gelo, mudando completamente de assunto.
Foi um alívio ela não ter mais tocado no assunto. Assim podemos aproveitar toda aquela tarde juntos, falando de amor e fazendo planos para o futuro. Planos que nunca seriam concretizados, mas que para nós naquele momento pareciam tão reais, tão possíveis.
Era como se não existisse o “se”, como se ao decidir fazer algo, isso se tornasse realizável, como se não existissem imprevistos e nada que nos impossibilitava de conclui-los.
Ah, querido leitor! Como a felicidade era abundante naquele dia! Dir-se-ia de um rio, que após grande tempestade, transbordara por não conter a vazão. Assim era meu coração – um rio após a tempestade.
Ah, como é bom recordar aqueles beijos! Beijos que não acabavam mais. Beijos longos, beijos curtos, beijos interrompidos, beijos continuados. Ah! Eram beijos de todas as formas: beijos decentes, beijos picantes. Ah, mas de que importa o tipo de beijo, se todos eles só nos fazia ficar mais apaixonados!
Durante a maior parte do tempo em que passamos naquele local afastado não foram ditas muitas palavras acerca do nosso passado. Houve sim algumas perguntas, contudo, fora aquele incidente das cartas, nada mais comprometedor. Além do mais, o que menos nos interessava naquele momento era o nosso passado. O que contava mesmo era o presente, o momento que estávamos vivendo. Não havia muito o que falar do passado, uma vez que nosso caso, apesar do tempo, não tinha passado, não tinha uma história. E assim como eu, Diana também parecia não se interessar por ele. De forma que era como se nossas vidas começassem a partir daquele ponto.
Hoje porém eu sei o quanto o passado faz falta. Sei, como sabia naquele exato momento, que o passado não pode ser mudado. Essa é uma lei da natureza que cientista nenhum será capaz de mudá-la. Todavia, hoje sofro devido a ele. Minha vida está se aproximando do fim sem que eu tenha vivido plenamente. Tudo por causa de não ter sabido fazer as escolhas certas no passado. Maldito passado! Por que temos que ter passado? Não seria melhor que fossemos como os animais, que vivem só de presente, sem ter consciência de passado e futuro? Por que nós humanos tínhamos que ser diferentes? Por que temos que carregar o fardo cada vez maior do passado?
Ah, como me fere o coração lembrar daquelas carícias! Daquelas mãos deslizando na face um do outro, daqueles lábios bem colados e dançando a dança do beijo, daqueles corpos colados sentindo o palpitar um do outro! Ah, como é sofrível lembrar o estado de excitação, de exultação quando nos tocávamos! Ah, meu corpo parecia queimar nas chamas do desejo! Mas era um desejo puro, uma reação natural no corpo de um rapaz na flor da idade. Eu a desejava, mas de forma quase inconsciente. Não, não havia a volúpia, o desejo puro e simples de saciar meus instintos naturais.
E quando agora eu vejo esse corpo enrugado, com aquela chama quase extinta, eu me ponho a lamentar. “Por quê?” digo em voz alta, “Por que não cumpri a promessa que fiz no momento da despedida?” Aquela promessa que não tive coragem de cumprir.
Sei que talvez tenha dito aquilo num momento de profunda emoção, mas se tivesse cumprido o que prometi, talvez teria sido um homem feliz.
Tento concluir esse capítulo, mas esse maldito “por quê” não deixa. Ele fica martelando ininterruptamente em meu cérebro, como as ondas do mar no rochedo. Não se cansam nunca. E quanto mais tento não pensar, não dar importância a esse “por quê” mais ele parece me atormentar. Eu digo para mim mesmo: Não! Eu disse para Diana que ia dar um jeito de voltar para buscá-la porque era o que eu queria.
E era a pura verdade. Quando me despedi dela, após molharmos o chão com nossas lágrimas, eu disse que ia dar um jeito de voltar para buscá-la, era o que eu mais queria. Eu não ponderava as dificuldades. Eu só pensava em retornar, terminar tudo com minha namorada e encontrar uma saída para ter Diana ao meu lado.
Certo dia, muito depois, sofrendo a dor da lembrança daquele dia em Santa Paula, escrevi o seguinte poema, com o qual encerro este capítulo:
Quando eu te deixei,
Houve uma lágrima;
E por muito tempo chorei
Enquanto eu me afastava...
A distância nos separava,
Impedia-nos de ser felizes;
E quando eu te deixava
Tudo parecia ter acabado.
Eu não queria partir,
Mas eu não tinha escolha;
Contigo eu queria fugir,
Mas coragem eu não tinha;
Eu sei que sofrer te fazia,
Eu sei que te machucava
Prometendo que um dia
Definitivamente retornava;
Mas é por que eu também
Queria que isso fosse verdade,
Mesmo que na realidade
Eu mentia para mim também.
As lágrimas que derramei
Nunca foram em vão;
Pois muito eu te amei,
E ainda te tenho no coração.
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MARCAS DO PASSADO
QUANDO O AMOR NÃO ACABA – CAPÍTULO VII
À NOITE À BEIRA-MAR
QUANDO O AMOR NÃO ACABA – CAPÍTULO VI
QUANDO O AMOR NÃO ACABA – CAPÍTULO V
QUANDO O AMOR NÃO ACABA – CAPÍTULO III
QUANDO O AMOR NÃO ACABA – CAPÍTULO II
QUANDO O AMOR NÃO ACABA – CAPÍTULO – I
O MILAGRE
UM LÍRIO AO PÉ DO PENHASCO
O PROFESSOR DE MATEMÁTICA
O MENINO QUE NÃO PODIA ANDAR
A CASA NO ALTO DA MONTANHA
POR CAUSA DE UM SONHO
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