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Discursos-->DISCURSO DE FORMATURA -- 23/11/2003 - 08:19 (Mario Roberto Guimarães) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
(Pronunciado em 15/08/1992, como orador da Turma Marcelo Rocha Monteiro). Faculdade de Direito – UERJ.


Senhoras e senhores:

Gostaria, inicialmente, de agradecer a presença do Diretor da Faculdade de Direito, Prof. Antônio Celso Alves Pereira, do nosso Patrono, Prof. Marcelo Rocha Monteiro, do Paraninfo, Prof. Eduardo Weaver de Vasconcelos Barros, de nossos homenageados, Profs. Luiz Fernando Silva de Magalhães Couto, Edina Bandeira de Mello Mambrini, José Otávio dos Santos Pinto e Luiz César de Souza Queirós e funcionários Haroldo Alves da Silva e Ronaldo Faraggi da Silveira, como também de nossos parentes e amigos, que aqui se encontram, prestigiando esta solenidade.

Nosso agradecimento especial à Comissão de Formatura, pelo seu incansável e prestimoso trabalho, sem o qual não seria possível a cerimônia que ora se realiza.

É, a um só tempo, uma honra e uma grande responsabilidade a tarefa que me foi outorgada de, em nome dos meus colegas, dirigir-me aos presentes.

Durante cinco anos aqui estivemos, compartilhando tanto os bons momentos quanto as vicissitudes que se nos apresentaram ao longo do caminho, o que, inevitavelmente, cria um clima de companheirismo do qual nós mesmos, algumas vezes não nos conscientizamos, preocupado cada um com seus próprios problemas, que já são por demais numerosos, face à situação de crise que a sociedade brasileira vem atravessando.

Este sentimento aflora com intensidade ainda maior neste momento, quando nos estamos separando, em busca cada qual de seu caminho, quer seja ele trilhado no exercício de atividade inerente à ciência jurídica ou não, haja vista que o bacharelado em Direito por vezes constitui-se em requisito ao desempenho de funções que não têm, propriamente, ligação com o mundo jurídico. Destarte, fica em cada um de nós a saudade do convívio com aqueles cuja amizade faz parte do rol de nossos bens imateriais, que são, afinal, os mais caros que conquistamos em nossas vidas.

Nesta turma estão, por certo, futuros Juízes, Promotores de Justiça, Procuradores e Defensores Públicos, além daqueles que dedicar-se-ão à advocacia, tarefa árdua, não só em razão dos percalços próprios, mas, também, em virtude da saturação do mercado de trabalho. Há, ainda, aqueles que se tornarão Professores e que terão a responsabilidade de transmitir a seus alunos os conhecimentos da Ciência do Direito necessários à sua formação profissional. Tais conhecimentos são a base sobre a qual o advogado desenvolve o seu trabalho, mas somente o tempo, paulatinamente, trará a sabedoria e a experiência capazes de transformar o advogado em um jurista. É de grande importância neste processo o papel do mestre, posto que, ao lado dos doutrinadores, ele influencia o estudante, cooperando, assim, na consolidação dos conceitos apreendidos e na formação da consciência jurídica do aprendiz.

Eis outro ponto que vale abordar. Ao dedicar-se ao exercício de atividade jurídica, o profissional vê-se, freqüentemente, diante de um dilema que, ao longo dos tempos, aflige o profissional do Direito, notadamente o Juiz: atender ao que dispõe o Direito ou ao que determina a Justiça?

Esta indagação tem-se constituído num dos grandes problemas de que se ocupa a Filosofia do Direito, com duas grandes correntes doutrinárias. Uma delas defende a tese de que a decisão do magistrado deve-se ater estritamente ao que está contido no texto legal, não cabendo interpretar a norma jurídica de forma a que se adapte ao interesse da Justiça. Afirmam os que assim pensam que, se a lei está errada, nada se pode fazer a não ser lutar para que o Pode Legislativo a modifique, ou mesmo revogue, mas em hipótese alguma pode o juiz contrariar o que está positivado através a elaboração do diploma legal, que, enfim, foi feito em consonância com as previsões constitucionais atinentes ao Processo Legislativo, inclusive porque não compete ao magistrado a função de legislar.

A outra corrente de pensamento sustenta que o Juiz, na condição de aplicador da lei, tem o poder e até o dever de, ante a imperfeição da disposição legal, suprir esta falha, objetivando sempre entregar uma decisão justa, ainda que, para isso, deixe de cumprir a determinação legal, atropelando o Direito para fazer Justiça.

Sabemos ser o Direito uma ciência social; inexata, portanto. Destinando-se a regular a convivência do homem em sociedade, o Direito leva em conta fatores como os costumes e as aspirações dos diversos grupos sociais, os quais, além de apresentar grande diversidade, envolvem aspectos éticos, morais, religioso, entre outros, suscitando, freqüentemente, questões como as que acabamos de expor.

Estas dificuldades não devem, entretanto, afastar o recém-formado da atividade jurídica, mas constituir-se em estímulo para que ele, exercendo a função para a qual está habilitado, colabore no aperfeiçoamento das instituições do Direito e, conseqüentemente, no engrandecimento de sua profissão e no bem estar da sociedade.

Para a consecução deste objetivo, vale-se o advogado daquilo que apreende no dia a dia, visto que, a cada novo caso que examina, aprende ele uma lição, fato este que se passa não só na atividade profissional, mas na própria vida, como nos ensina o antigo adágio: “vivendo e aprendendo”.

Trabalhar no sentido da correta aplicação da lei, buscar o prevalecimento da Justiça, perseverar no interesse do bem estar social, pugnar pela igualdade, são os principais objetos da atividade do jurista, como também da própria existência do Direito.

Mas em que consiste, enfim, a verdadeira igualdade? Seria ela rígida, como a igualdade matemática? Obviamente que não. Do ponto de vista da convivência em sociedade, parece-nos pacífica a impossibilidade de que se estabeleça a igualdade absoluta, uma vez que as pessoas, na defesa de seus interesses, comportam-se de forma diversa uma das outras.

A esse respeito, opinou um de nossos mais eminentes juristas, o grande Rui Barbosa, na Faculdade de Direito de São Paulo, ao falar como Paraninfo de uma turma. No célebre discurso conhecido pelo título de “Oração aos Moços”, afirmou o inigualável mestre: “A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente os desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade”.

Parece-nos incontestável a exatidão deste conceito de igualdade, no que concerne ao mundo jurídico, porque não seria compreensível outra visão da questão.

Diante, portanto, da complexidade da atividade jurídica, exige ela do jurista qualidades como a disposição permanente para o estudo, no sentido de que esteja sempre atualizado, face às mudanças constantes da sociedade;a percepção do real significado destas mudanças; a perseverança, tão necessária ao seu aprimoramento profissional; a probidade, exigível que é daquele que lida coma lei e, sobretudo, o senso de justiça, sem o qual não será um jurista completo, ainda que possuidor de grande preparo técnico.

Assim, no decurso de nossas carreiras, lembremo-nos sempre de que muito há que lutar, porquanto são muitas e muito grandes as dificuldades que se haverão de interpor no caminho que temos a trilhar. O jurista deve ser incansável, na busca do aprimoramento da vida em sociedade. As grandes nações são construídas tendo a justiça como pedra basilar.

Ao final desta jornada acadêmica, quero expressar aos meus colegas o sincero desejo de que cada adversidade torne-se um estímulo; cada insucesso, uma lição; cada novo dia de trabalho, a recompensa divina ao vosso esforço; cada vitória, não uma glória efêmera, mas uma página de uma longa história de dedicação à causa da Justiça. Sede felizes na atividade que ireis exercer e lutai diuturnamente por aquilo em que acreditais.

Deus vos abençoe e ilumine.



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