Aprendizado no carnaval que passou...,
Iluminado, com o luar da noite entrego meus anseios adentrando a Avenida da Televisão. São imagens de gente arranhando pedras com esperança no futuro que há de vir.
São seres vivos bailando em ritmo da magia dentro de sambas com enredos monumentais. Infelizmente sem o som das matas ou canto dos pássaros. Que desfilam em mim, delírio momesco.
Acende a fogueira dos pensamentos; perco a razão e viajo sem drogas. Lúcido!
Adentro a passarela, encontro foliões, profissionais, artistas e plebeus amadores, na entrega total de liberdade sem pudor. Cenários multicores de musas e homens, vestidos de orixás, índios, baianas, reis e rainhas. Não vi minha Iemanjá, ou Ogum que me guia, mas não sigo.
Milhões de figuras da idade média, com peitos e corpos nus, sem cenas de sexos; rebolam e sambam em minha retina aloucada. Sou um ser humano normal? Acho que sim!
No bailado irreal, entrego à ilusão dou vida à imaginação. Adentro na apoteose da emoção, estou na Sapucaí vestido com um saiote de armador helênico entrego-me aos braços do carnaval.
Nos intervalos dos sons, reparo nas vaidades pessoais. Todos olham para o corpo e dão os últimos retoques. São maquiadores que ganham em ouro, embelezando seres que viviam vidas normais.
Aqui retocam os que podem pagar deixando nos pobres o sonho de um dia poder ser tocados por esses, bons profissionais da maquiagem.
São ninfas e gays; reis e ninfetas. Musas para todos os gostos e regimes. Vejo rainhas do império ultrapassado. Estão cada vez mais belas dentro do artificial.
O sambódromo é um palco iluminado por muitos sacrifícios. Muitas horas de clinicas que receberam em suas lixeiras, gorduras e pelancas adquiridas após o último carnaval.
Descubro que à beleza não é como nos tempos dos meus pais. Hoje as lipos sugam todas gorduras em excesso. Academias recebem em suas esteiras musas que passam o ano trabalhando. Não conseguem viver em férias como qualquer mortal. Escondem dores dos agachamentos, dos spinnings, das dietas. Sacrifício da beleza profissional!
O carnaval é a vitrine para o seu sustento anual. Um bom visual é sinal de faturamento e presença constante na televisão, revistas e jornais.
Honestamente acho valido o que à mulher faz para manter-se bela! Não entendo o porque do terceiro e quarto sexo? Acho que sou tragado por costumes familiar em que o homem era homem e a mulher, simplesmente mulher.
De repente um olhar de um corpo escultural, em forma de mulher, fere meus olhos.
O calor da fogueira do desejo esquenta meu corpo.
O sentimento é mútuo! Envergonho-me com meu estado maldoso, de querer amar em pleno desfile.
A Ninfa famosa com seus requebros levanta meus desejos, que ficam a ensejar o fim do desfile para aquele corpo abraçar.
Durante o desfile penso o que essa musa famosa passou para estar no alto do carro alegórico. Mas os meus desejos inconfessáveis tiram de mim à razão do raciocínio, e em luta constante dos pensamentos; consigo por vezes encontrar minha razão branca que afasta a emoção negra.
Preciso confortar aquela mulher famosa, que chega na apoteose dos sacrifícios, com muito brilho e inveja. Pensei!
Com certeza serei alvo das câmaras dos fotógrafos e das colunas sociais. Mas nada importa! O que posso perder se nada tenho? Nossos olhares cruzam os fachos de luz, vindos dos holofotes que embelezam o corpo moreno e brilhante da mulher que aquece a retina de plebeus que como eu, bajulam aquela beleza da mídia nacional.
Aquela beleza tem que ser minha. Pensei!
Finda o desfile procuro-a, e sou recebido por um sorriso amável e acolhedor. Elogiei o desfile, que não vi, por causa dela. Conversamos sobre a manifestação do público. Mas ela sem modéstia dizia que foi há mais aplaudida.
O séqüito que a acompanhava, não parava de cumprimenta-la! . Coitada não sabia que todas diziam as mesmas palavras. Meus ouvidos estavam aguçados e ouvia durante o cortejo, às mesmas palavras.
O contentamento era contagiante! Sempre alguém tinha recebido mais aplausos e carinhos. Vaidades estavam presentes com muita nudez, plumas e purpurina.
De repente aquela linda mulher, pede-me um tempo para que o maquiador possa retocar sua maquiagem. Finjo que não reparo, e com o rabo dos olhos, estupefato vejo que os seios para se manterem firmes e belos; recebem uma proteção de esparadrapo cirúrgico, imperceptível aos olhos; por ser da cor da pele.
Percebi, quando o maquiador tirou e colocou outro adesivo. Fazendo com que os seios, novamente ficassem firmes.
Minha odisséia começava a ficar triste. O desejo de repente sumiu. Veio à admiração há criatividade dos profissionais da maquiagem. Fico imaginando como estaria meu ego tocando aquele corpo?
De repente vejo o maquiador esborrifando o laquê, por cima de uma base colocada na bunda e nas coxas. Invejo aquele homem, que com movimentos sensuais no corpo da ninfa, provoca em mim o êxtase - Quero ser maquiador, pensei! Mas sem pestanejar digo que não!
O homem parece não ter o mesmo gosto meu. Quando começa a falar, reparo nos trejeitos das mãos nos quadris – Não quero ser maquiador!
Minha lucidez chega rápido, com o laquê brilhando naquele corpo esbelto. Intrigado e dentro da minha estupidez, pergunto aquela beleza de mulher para que aquilo tudo? Como resposta recebo essas palavras: - Esse produto deixa minha pele brilhosa e uniforme. Meu bumbum fica durinho, e disfarça minha celulite.Não preciso usar meias calças que usava para esconder meus buracos. Sempre usava antes da descoberta duas meias calças com o biquíni e não gostei do que os meus olhos enxergavam!
Então um maquiador mágico prontificou-se a ajudar. E, adorou o resultado e manteve aquele segredo por longo tempo. Mas o profissional não manteve o segredo. Hoje nas musas é normal o uso do laquê. Afirmou!
Quando penso que a panacéia acabou, vejo nas mãos do maquiador óleo de amêndoas dando o brilho aquele corpo que pensei escultural; uniformizando a cor da pele, da cintura para cima. Fico pensando quando à mulher vai voltar ao natural? Gostava de correr meus lábios nas pernas e sentir o sal do corpo. Esse prazer tem que abolido em mim. Outra vez, minha lucidez está presente.
Sem querer surge uma maneira do pobre enfeitar-se sem gastar muito. Aquelas meias calças dos outros carnavais, já não existem mais. O silicone está com os dias contados no meio das que se endividavam para serem belas. Pena que os pelos estão desaparecendo com a depilação. Adoro pelos, porque posso depila-los!
Acredito que os nadadores foram os responsáveis pela aderência da purpurina e dos óleos específicos para brilhar a pele. Com a raspagem dos pelos ficou fácil à fixação de tintas e óleos no corpo humano.
Para terminar meu aprendizado, descubro, que um velho truque dos travestis encontra adeptas nas musas que desfilam de saiotes. Fazem tiras de espuma que são enroladas nas coxas, antes de vestir a meia calça. Trata-se do famoso “Pirelli” que dá um visual maravilhoso.
De repente a Musa, tira meus pensamentos. E pergunta se quero ir até sua casa na Barra? Pergunto só eu e você? Ela ri e maravilhosamente bela diz – Hoje não vai dar para ficarmos sós. Vamos passar o filme do meu desfile. Quero mostrar aos amigos minha proeza na Sapucaí.
Como meu desejo por ela tornou-se esquecido, com tantas mentiras, fui despertado por uma ninfeta de olhos negros, mas natural, que ousada sorria um convite de amor.
Pedi desculpas à musa, inventando uma mentira real; pedindo perdão por não poder ir, porque me distrai com a beleza dela, mas tinha compromissos em Rondônia, Ipaússu ou S. Cruz do Rio Pardo/ Sp, ou Maranhão? Mas com certeza no Rio de Janeiro não era. Minha memória com tanta beleza me aviltava.
- Terei que pegar o único vôo. Menti!
Desejei boa sorte àquela Musa, prometendo que no próximo carnaval estaria de novo na Avenida. Ela sorriu e pediu para que eu aparecesse. Beijei suas mãos, e corri abordei a ninfeta monumental que cinicamente e ousada aguardava minha despedida.
Caminhamos para o carro. Chega de carnaval! São como os papos da internet. Chegam de celulites, esparadrapos e Pirelli! Preciso sentir vida e verdade.
Aqui do micro, corro meus olhos cansados, no corpo moreno deitado. Dormindo um sono profundo em meu divã.
Um corpo delgado, com sabor do pecado; sem preconceito ou defeitos. Mas feminino sem vaidades, agora sem vontades. Os cabelos desfeitos por cima dos seios. Dando completa realidade há minha odisséia imaginativa. Aguardarei dentro dos meus sonhos, realizar o final da panacéia que em mim, às imagens da televisão alimentava...