O sentimento de solidariedade está muito presente nesses "tempos bicudos". Quando somos solidários, estendemos a mão. Uma mão espalmada que diz sim. A mão aberta que cumprimenta, afaga e conforta. Uma mão que consola.
As mãos estão ao nosso alcance no dia-a-dia. Mãos que suplicam a ajuda, um prato de comida ou um agasalho. Mãos mudas que trazem nas palmas as rugas da lida e sofrem com a existência do ocaso do tempo. Mãos ao relento que rogam ao vento carícias vãs. Mãos nas manhãs que agradecem o sol na sua janela.
Mãos estendidas que recebem e mãos estendidas que ofertam. Mãos finas e limpas que entregam a manta e mãos sujas e enrugadas que dizem adeus. Mãos que carregam tralhas, restos de comida e muitos frangalhos. Mãos que acariciam as faces dos anos, tocam os cabelos brancos do tempo e rogam em silêncio os perdidos do ocaso. Mãos que choram, clamam a cura, mãos sem frescura que cumprimentam os humildes, acalentam as crianças e estendem a luz. Mãos fortes que carregam macas e mãos fracas que apóiam bengalas. Mãos trêmulas que conhecem os anos e os enganos nas frias manhãs.
E as mãos que são más e apertam o botão que explode a bomba. Uma mão de voz calada que nas palmadas, desagrada. Uma mão que bate sem sentimento e carrega para a eternidade o algoz das eras. A mão que fere sem remorso e traz no dorso picadas de agulhas. A mão que trucida sem piedade e a mão sádica que esmaga e sorri.
Mãos que alcançam a água da taipa da vida à s bocas sedentas do líquido frescor. Mãos sem pudor que tocam nádegas e pedem carícias na noite de luz. Mãos que conduz a criança na calcada da vida e mãos que atravessam ruas e são anciãs.
Na solidão das noites insones procuramos a felicidade em encontros fortuitos na tela do computador e as mãos tocam o teclado e imprimem no vídeo angustias de espera, sonhos tapera e esperanças inatingíveis.
E nas tardes de chuva do verão do sul, vemos mãos que dançam nos embalos dos pingos e na concha do vento sulcam a terra em lágrimas e lamentos ao alcance do dia.
Na vida campeira as mãos tocam a relva úmida do orvalho, apalpam o chão, revolvem a terra e plantam a semente. Plantam a esperança, germinam a vida e colhem a paz. São palmas que colhem a uva e sovam o pão. E de antemão saciam a fome, de quem se consome na luta do dia.
Na partida sempre haverá mãos que acenam. E a despedida é solitária na janela do ónibus que desliza lentamente no pátio da rodoviária. E somem pelo caminho mãos que jamais veremos. E esqueceremos.
No sacrifício vivido, as mãos sangram nas cruzes, rogam oferendas e suplicam a paz. Mãos que choram com as mães e perdoam os carrascos na intempérie das horas.
As mãos obedecem a mente e seguram a pena, que traçam no branco a suas penas, escrevem poemas em horas insólitas e fazem canções com raios de vidas e sombras de luz.
Sentimos as mãos pesadas que choram caladas o ente querido. E mãos que descansam, na paz do sepulcro, sobre o peito adormecido.
Trago calado as mãos dos anos e fico ausente de um tempo tirano. E sigo em frente numa vida aragana.