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Contos-->Pedro pedreiro -- 18/04/2003 - 17:43 (Athos Ronaldo Miralha da Cunha) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Pedro pedreiro
Athos Ronaldo Miralha da Cunha


São 5:00h da manhã de uma quarta-feira normal. O despertador toca, um antigo relógio de cordas que acompanha Seu Pedro há muitos anos. Um relógio antigo, daqueles com a cara dos avós.
Levanta-se e inicia os preparativos para mais uma longa jornada. Abre a janela de seu quarto e vê no horizonte um clarão que ameaça a noite que se entrega ao dia. Pedro já perdeu a conta das vezes que acordou nesse horário. O dia ainda não clareou, mas há movimentos no interior dessa humilde casa. Os afazeres começam cedo. Colocar lenha no fogão, esquentar a água para o café e ferver o leite.
Dona Irene, sua companheira de longos anos também já está acordada. Dona Irene começa preparar o café dos guris, que logo estarão acordando e movimentando a manhã do velho casebre, e ajeitar a marmita do velho Pedro pedreiro. Lá fora, ouve-se o despertar de um galo. Um latido de um cão. Assim acorda um simples trabalhador nesse país. Um cidadão que leva uma vida muito sofrida e recebe parcos vencimentos. Mas Pedro vai, calejado pela vida, sobrevivendo.

Ambos estão em silêncio na cozinha de parcos utensílios domésticos do chalé da família Lima Pereira. Pedro Lima Pereira Neto. - Com muito orgulho. – como sempre dizia. Mora no subúrbio, longe de tudo, perto do nada. Mora numa metrópole que é vista a noite num reflexo de um clarão das luzes no céu. Uma metrópole que pouco olha para seus filhos deserdados da sorte. Pedro ainda arranja um tempinho para dar uma caminhada no seu pequeno pátio, gostava de sentir o dia amanhecer. A noite sendo lentamente consumida pelo dia.

Dona Irene liga o rádio. Gosta de ouvir as primeiras notícias do dia. Normalmente sobre roubos assaltos e assassinatos.
De repente uma chamada urgente do repórter, coloca Irene atenciosa.
“No beco dos Juvêncio uma mulher mata o filho de sete anos com doze facadas”.
- Nossa! Meu velho, esse beco não é onde mora sua irmã com os filhos?
- Isso mesmo. Troca de rádio que eu não suporto essas notícias. Todo dia a mesma: Gente matando gente. Quando não é aqui é lá nos estrangeiros.
Dona Irene prontamente coloca o dial em outra estação, mas o velho Pedro terá que ouvir a mesma notícia com a mesma manchete. Ou melhor, quase a mesma manchete.
“No beco dos Juvêncio uma mulher mata o filho de doze anos com sete facadas”.
- Peraí! - Gritou seu Pedro. - Pra burro eu não sirvo. Não era um filho de sete anos com doze facadas? – Pedro tinha poucos estudos, mal e parcamente assinava o nome, cursou até a segunda série, mas era bom de contas.
- Não lembro meu velho. E faz diferença? O guri ta morto.
- É. Diferença não faz... Mas alguém está dando a notícia errada.

Pedro coloca sua marmita numa surrada sacola com a estampa de uma empresa de engenharia e sai em direção à parada do ônibus. Palpita em sua mete os números do azar... Ou da sorte.
- 7 anos, 12 facadas... Uma centena bonita: 712. – segue pensativo.
Caminha com passos apressados pela manhã que antecede mais um dia desse outono choroso.
- 12 anos, 7 facadas... Outra centena bonita: 127. – comenta para si os números do rádio.
Pedro dormita no vaivém dos trens e ônibus da capital. Duas horas para ir e mais duas horas para voltar. Já está chegando à obra quando encontra o bicheiro, o seu Antenor.
- Vamos fazer uma fezinha seu Pedro? Tá sem palpite hoje?
- Não compadre. Joga no 712.
- Na cabeça?
- Invertido também.
Mas Pedro não quis fazer a fezinha. Achou um sacrilégio usar a desgraça dos outros para tentar a sorte. Pedro era uma pessoa religiosa. Freqüentava o culto de sua igreja todos os domingos.

Pedro assentou tijolos. E assim passou o dia sob o um sol agitado de outono. Pedro ergue edifícios e acalenta sonhos quase impossíveis. Pedro olha em direção ao céu e roga ao santo padroeiro uma vida menos sofrida. Pedro trabalha dias a fio, não tem feriados e nem domingos. Quando não está na obra está fazendo pequenas reformas nos casebres da vizinhança, para aumentar sua modesta renda mensal.

Quando voltava para casa, um bilhete da Loteria Federal chama sua atenção na vitrine de uma lotérica. Está lá o bilhete inteiro. 12712 números que iluminaram seu olhar. Não podia deixar de comprar. Um prêmio de R$ 200.000,00. Estava pensativo diante da lotérica. Estava com dúvidas, pois um gasto desses é praticamente a féria de um dia, afinal R$ 20,00 sempre fazem falta na mesa. Desistiu. Não quis comprar o bilhete. Preferiu economizar e comprar leite para as crianças. Além dos mais, seu lado religioso falou mais alto. Seu coração não permitiu tamanha heresia. E se foi sonolento dentro do ônibus de volta pra casa. O velho pedreiro não quis comentar com sua esposa, pois os números do bilhete condiziam com as facadas e a idade do garoto assassinado. Inclusive invertido. Seria um sacrilégio e um atentado em sua religiosidade. Não estava arrependido.

Sábado à tardinha, estavam sentados em frente ao chalé da rua Brasil, conversavam sobre a vida dura que levavam e escutavam o rádio. Um programa de músicas sertanejas. Dali a pouco o locutor anuncia os números sorteados pela Loteria Federal.
- O primeiro prêmio! O transudo velho! Aquele que vai engordar o bolso do vencedor! - e começou a divulgação.
- 1, 2, 7, 1 e 2.
Pedro começou a sentir-se mal. Com falta de ar e ofegante chamava pela companheira.
- Irene! Irene! Irene! Irene!
- O que foi meu velho?
Colocou a mão no peito e foi caindo lentamente de sua cadeira. Quando Irene viu seus olhos eles já estavam vidrados. A emoção e o arrependimento foram cruéis com o velho pedreiro. Não suportou a idéia de ter perdido o primeiro prêmio da loteria. Pedro deixou a esposa e três filhos pequenos numa tarde de um sábado comum nesse nosso Brasil.




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